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domingo, 17 de abril de 2011


E que boca se atreverá a beijar ansiosa essa multidão de cães, famintos e espalhados pelos sábados e domingos, ou quem se atreverá a encostar nesse corpo conduzido pelo tempo condenado ao infortúnio desafeto, quem procurarás na distância tamanha solidão. Mas a casa já não abriga tanta coisa como antes, só uns sapatos, uma ou outra impressão digital da alma, uns palavrões gravados pelas paredes da cozinha, a cama sem os pés, o guarda roupa sem as minhas roupas. E se eu voltasse faria uma faxina, recolheria os pertences dos outros e de porta em porta devolveria objeto por objeto aos respectivos dono. Não me imagino com cinquenta anos e ter ajuntado em casa restos de gente.


(Celso Andrade)

Um comentário:

Guilherme Navarro disse...

O melhor post do Blog na minha opinião. Já começa de tirar o fôlego. Parabéns!